sexta-feira, junho 03, 2005

Deixa-me ouvir o que não ouço



Deixa-me ouvir o que não ouço...
Não é a brisa ou o arvoredo;
É outra coisa intercalada...
É qualquer coisa que não posso
Ouvir senão em segredo,
E que talvez não seja nada...

Deixa-me ouvir... Não fales alto !
Um momento !... Depois o amor,
Se quiseres... Agora cala !

Tênue, longínquo sobressalto
Que substitui a dor,
Que inquieta e embala...

O quê? Só a brisa entre a folhagem?
Talvez... Só um canto pressentido?
Não sei, mas custa amar depois...
Sim, torna a mim, e a paisagem

E a verdadeira brisa, ruído...
Vejo-me, somos dois...


Fernando Pessoa

1 comentário:

Pistaxa disse...

Gosto especialmente "Um momento !... Depois o amor,
Se quiseres... Agora cala !"
Depois o amor?mas o amor vem primeiro pah =) dpz é kl se deve ouvir hihihihi =)
"Vejo-me, somos dois..."
Acaba em beleza.o ópio faz milagres vcs nãop se acreditam...=))
Lindaum